de Dorian Anderson Soutto

 

 

Lá estava eu em uma faculdade na capital da Bahia arrumando encrenca….

Calma! Eu explico:

Aproveitando que eu iria a um congresso missionário em Salvador, uma mãe pediu para que eu e minha esposa nos hospedássemos na casa de sua filha, que por sua vez morava com a avó. Na realidade as duas moravam em um apartamento pequeno, mas a avó tinha ido para São Paulo e deixado a filha sozinha. Uma jovem daquelas que amamos só em cumprimentar.

Eu ficava no congresso de dia e voltava para o apartamento ao por do sol que, diga-se de passagem, é lindíssimo. Combinamos de tirar um dia para conhecer a capital soteropolitana e antes de iniciar nosso tour passamos na faculdade para pagar a matrícula e acertar uns detalhes da inscrição daquela jovem. Como todo brasileiro deixa tudo para a última hora e baiano é brasileiro, encontramos a faculdade lotada.

Sentei em um banco de alvenaria e fiquei esperando minha esposa e sua nova “filha” que se adentraram pelos corredores. Várias pessoas estavam ali na espera, inclusive um baiano legítimo, filho de Salvador, que me abordou.

– Quer comprar um livro?
Olhei em sua mão, um livrete de aproximadamente 15 páginas.
– Depende! Respondi já pegando um na mão.
– É para pagar minha pós. Te faço um real.
– Eu fico com ele se esperar eu ler e comentar.
– Tu é paulista.
– Por que? É mais caro para turista?
– Não! É seu jeito. (Não sei se aquilo era um elogio)
– Você nasceu aqui?
– Sim! Tu pode lê. Se não gostá, devolve.

Olhei o título. Era um livro de poesias: “A linguagem do Amor” (Se não me engano).

Uma coisa que percebi no povo baiano é que são curiosos, se bem que estava escrito em minha testa “turista”. Sentei para ler e o “povo” rodeou o banco. Era alguns alunos que estavam por ali.

Apenas passei os olhos e já vi do que se tratava. Neste espaço já avistei minha esposa chegando com olhar de espanto e um balão de pensamento na cabeça: “De novo!” Ela conhece o marido que tem.

Como não ando com dinheiro, pedi a ela:
– Me dá um real.
Ela me deu e entreguei ao jovem. Mas antes de soltar o dinheiro, eu disse:
– Você disse que eu poderia dar minha opinião.
– Pode falar! Respondeu ele já guardando o dinheiro.
– Foi a pior definição de amor que já li em minha vida!

Todo mundo ficou me olhando. Minha esposa já tinha mudado o balãozinho para: “Pronto! Apanhou!”

– Horrível! Leia aqui o que você escreveu: Passar a língua aonde? Isto não é amor!Vou ler para você um verdadeiro poema de amor, e se você acertar quem é o autor, poderá fazer como eu, ou seja, dar o seu comentário. – Combinado?

Ele apenas acenou com a cabeça que sim, tentando imaginar de onde eu tiraria um poema, se estava com as mãos vazias. Enfiei a mão no bolso, tirei o Palm Top, abri minha bíblia digital em I Corintios 13, limpei a garganta e o Espírito Santo fez o resto.

– Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor…

Meu coração queimava, parecia que aquelas pessoas nunca tinha ouvido algo tão lindo.

Terminei recitando o final e já guardando o Palm no bolso. As últimas palavras que ficaram no ar foram:

– Agora, pois, permanecem a fé, a esperança, o amor, estes três; mas o maior destes é o amor.

Todos estavam em silêncio, os punhos não estavam mais serrados, o ambiente era leve.

– E então? Sabe quem é o autor?- Sei!

Olhei para ele admirado e confirmei o olhar de minha esposa igual ao meu.

– Então fala logo!?- RENATO RUSSO! – Disse ele em alto e bom som.

Juro que tentei ficar sério, mas não teve acordo. Soltei uma gargalhada.
– Errou! É de Paulo.
– Paulo?
– Sim! Paulo de Tarso.
– Nunca ouvi falar!
– Já leu a bíblia alguma vez?
– Nunca!
– Já te falaram de Jesus?
– Não!

Abaixei a cabeça, mordi os lábios como faço de costume quando estou pensando. Não é possível, em uma cidade deste porte, alguém desta idade nunca ter ouvido falar de Jesus. Ele deve estar tirando uma onda comigo.

Levantei a cabeça e pensei: seja o que Deus quiser e Ele não quer que nenhum pequenino se perca.

– Como é seu nome?
– Augusto (fc)
– Augusto, vou te falar de alguém que é a maior expressão de amor que um homem pode conhecer. Alguém capaz de dar a vida por um desconhecido, a vida por você.

Nos próximos minutos que se adentraram falei do amor de Deus Pai e do amor de Deus filho, tudo na maior simplicidade, sem citar versículo algum, apenas dizia “na bíblia está escrito”. As pessoas que estavam em volta não foram embora, ficaram apenas escutando aquele paulista esquisito falar coisas tão bonitas. Talvez tivesse até algum filho ali no meio, mas não se pronunciou.

Falei mansamente, como em uma conversa entre dois bons amigos. Meu coração queimava e olhos de alguns brilhavam. Estimulei-o a buscar o amor na verdadeira fonte, para um dia escrever sobre o amor que faz a diferença, escrever sobre o amor que o alcançou naquele dia na faculdade.

Peguei na mão de minha esposa, “Vamos?”.
-Tchau para vocês! Deus os abençoe! Foram minhas últimas palavras.

Lá fora passei pela lata de lixo e joguei o livreto, para não cair acidentalmente nas mãos de minhas filhas. “Coisa de adulto”

– Perdeu um Real! Disse minha esposa.
– Muito pelo contrário. Respondi
– Foi o maior investimento que já fiz com um real.

Uma pena eu não ter uma bíblia para presenteá-lo, mas talvez aquelas palavras nem eram para ele. Talvez era apenas o cumprimento de Jeremias 31:3 na vida de alguma pessoa que nos ouvia.

“De longe o Senhor me apareceu, dizendo: Pois que com amor eterno te amei, também com benignidade teatraí.”

E o que é que o Baiano tem?
Aquele em específico eu descobri: “Sede”
Como qualquer outra criatura no universo que ainda não conheceu a Cristo.

 

 

 

Copyright © 2005 Dorian Anderson Soutto. Todos os direitos reservados.