de Dennis Downing

Será que a caridade pode efetuar o perdão de pecados? Será que você pode apagar algum pecado seu ou de outro através de um sacrifício ou doação? Isolada e interpretada sem o contexto maior, a frase do apóstolo Pedro “o amor cobre multidão de pecados” já deu a alguns a idéia de que um ato, um sacrifício, ou um grande esforço ou abnegação poderia efetuar o perdão de pecados seus, ou de outra pessoa.

Mas, será que é isso que Pedro quis dizer em 1 Pedro 4:8 quando ele escreveu “Acima de tudo, porém, tende amor intenso uns para com os outros, porque o amor cobre multidão de pecados.”?

Primeiramente, a palavra traduzida como “perdão” ou “perdoar” na NTLH e NVI significava originalmente “cobrir, ocultar ou esconder”. Em nenhuma das outras passagens em que ocorre no Novo Testamento (como Mt 8:24; 2 Cor 4:3; ou Mt 10:26) a palavra significa “perdoar”. Esta palavra é melhor traduzida como nas versões da Revista e Atualizada e a Corrigida por “cobre” (o amor cobre multidão de pecados).

Para entender esta passagem, é fundamental partirmos do princípio de que o perdão de pecados vem somente em Cristo e por meio do sacrifício redentor dEle.
– “Jesus, porém, tendo oferecido, para sempre, um único sacrifício pelos pecados, assentou-se à destra de Deus.” Hebreus 10:12
– “E não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos.” Atos 4:12

Nenhum ato nosso, por maior ou mais doloroso que seja, pode efetuar o perdão de um único pecado. Somente o sacrifício de Jesus foi capaz de fazer isso, e somente o sacrifício dEle na cruz é aceitável a Deus para perdão de pecados. Eu não consigo perdoar pecados, nem meus nem de outros no sentido absoluto. Eu posso perdoar o que alguém fez para comigo. Mas, não consigo para ele perdão diante de Deus pelo que ele fez. Isso só Deus pode fazer.

Mas, como é então que o amor “cobre” pecados se não os perdoa? Vemos isso no contexto maior. A frase completa de Pedro é “Acima de tudo, porém, tende amor intenso uns para com os outros, porque o amor cobre multidão de pecados.” Este amor “intenso” (ou como traduz a NVI “sincero”) é um amor determinado. Não é um amor casual, que nasce de emoção ou algum vínculo passageiro. É o amor que vem daqueles que já descobriram o quanto Cristo sofreu “na carne” (4:1) por eles.

Pedro começa esta parte da carta relembrando seus leitores “Uma vez que Cristo sofreu corporalmente, armem-se também do mesmo pensamento, pois aquele que sofreu em seu corpo rompeu com o pecado, para que, no tempo que lhe resta, não viva mais para satisfazer os maus desejos humanos, mas sim para fazer a vontade de Deus.” (1 Pedro 4:1-2) Parte desta vontade de Deus é o amor mútuo, uns para com os outros, um amor que é tão forte que é capaz de não só perdoar, mas, de procurar poupar quem pecou contra nós.

Lenski, no seu comentário sobre esta passagem, refletiu “Amor esconde (os pecados dos outros) da sua própria vista, mas, não da visão de Deus. O ódio faz o contrário, ele bisbilhota para descobrir algum pecado ou semelhança de pecado num irmão, para daí espalhar e até exagerar, festejando a descoberta.” Ou seja, aquele que compreendeu o quanto Cristo o amou, ao ponto de sacrificar seu próprio corpo por ele, vai amar seus próximos com um amor sincero e determinado. Ele vai deixar de lado os danos que sofre, vai olhar além das falhas do seu próximo e vai, no que competa a ele, “cobrir” os pecados dos outros.

Não podemos “pagar” pelos nossos pecados amando outros, ainda que de forma sacrificial. Nem tampouco podemos fazer isso pelos pecados dos outros. Mas, podemos fazer algo que, para seres humanos, talvez seja ainda mais admirável – cobrir o mal que outro fez conosco. Ao invés de tornar notório, de espalhar, ou de perseguir a “justiça” por um mal feito contra nós, nós podemos decidir fazer parte da “justiça” de Deus – de encobrir o pecado, a falha, o fracasso do outro.

Certa vez após a sua ressurreição, Jesus se encontrou com o próprio Pedro numa praia, sentado com os outros discípulos ao redor de uma fogueira (João 21:15-17). Jesus escolheu não lembrar a Pedro (e aos outros) o quanto Pedro falhou na sua promessa de ir com Jesus até a morte, e, pior ainda, que ele negou o Mestre veementemente em público. Jesus teria todo direito de levantar aqueles pecados, de repreender a Pedro, de indagá-lo se ele estava mesmo arrependido. Mas, tudo isso Jesus deixou para trás. Ele cobriu.

Ao invés disso, Jesus apenas perguntou a Pedro se ele O amava. Jesus sabia o quanto Pedro estava envergonhado pelo seu pecado. E querendo “cobrir” isso, Jesus sequer mencionou; apenas deu a esse querido discípulo a oportunidade que ele tanto precisava de se redimir, e em público, de talvez o maior e mais doloroso pecado da sua vida – pecado justamente contra Ele, Jesus. Depois de acolher a declaração de Pedro, o pecador, Jesus confiou a ele a grande missão da sua vida: “Pastoreia as minhas ovelhas.”

Imagine o quanto isso significou para Pedro. Será que ele estava lembrado daquilo que Jesus fez com ele, Pedro pecador, quando ele escreveu “tende amor intenso uns para com os outros, porque o amor cobre multidão de pecados”?

Dúvidas? Leia mais sobre esta passagem em Um Estudo Sobre 1 Pedro 4:8

Veja também O Caminho de Dennis Downing.


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